No filme Entrando Numa Fria Maior Ainda, Dustin Hoffman faz um pai amoroso que revela segredos do filho, um rapaz que dormia no quarto dos pais até os dez anos de idade, para o espanto do futuro sogro Robert de Niro, um tipo durão que está “ferberizando” um bebê, ou seja, deixando a criança chorar sozinha até pegar no sono. Esta situação hilária exemplifica uma das dificuldades que temos vivido neste início de século: colocar uma criança para dormir.
Nos anos 80 não existia ainda a Super Nanny (a babá que dá dicas na televisão), nem a profusão de livros sobre como resolver os problemas de sono de uma criança. Quando fiz faculdade e estudei pediatria, o tema nem existia no ensino médico. Foi quando o americano Richard Ferber (daí o termo ferberizar) lançou um livro interessante, em que pregava a rigidez que tinha se esvaído na troca de gerações: “deixe a criança chorar… de 5 em 5 minutos, entre rapidamente no quarto e saia logo em seguida”. Nesta época, ajudei muitos pais a resolver a questão dos filhos insones com a ajuda do método Ferber. Mas, às vezes, esta abordagem pode ser muito cruel para um pequeno ser humano que ainda não sabe se controlar e, sinceramente, acredita ter sido abandonado no momento em que a mãe saiu do quarto.
Para entender porque a criança acorda durante a noite, precisamos lembrar que somos animais, descendentes de seres que viviam em contato permanente com o perigo. O ciclo de sono entrecortado facilita a uma loba, por exemplo, dar várias acordadas superficiais para checar se os filhotes estão ou não em perigo, se o ambiente à volta permanece o mesmo, ou seja, seguro. Da mesma forma, a nossa noite de sono também é dividida em ciclos. A cada 2 horas, entramos por momentos em um sono bastante leve; ficamos a ponto de “quase acordar”. Se o ambiente à nossa volta estiver diferente (alguém levou o travesseiro embora, por exemplo) acordamos completamente.
Então ficou fácil entender porque uma criança, que pegou no sono mamando, dormindo no colo ou na sala, acorda depois de duas horas quando se vê rodeada pelas grades do berço. O ambiente à volta dela mudou e o hábito terá de ser repetido para que ela volte a dormir. A mãe então volta a embalar a criança ou colocar a chupeta. Mas a criança não está precisando de comida quando, após 6 a 7 meses de vida, a mamada tem que ser repetida no meio da noite. O que ela está precisando é de um hábito saudável para dormir. Nossos avós diriam o quê? Deitar na cama e dormir, oras!
Mas a rigidez de antigamente esbarra com a nossa falta de rituais do presente. O processo de dormir começa pelo menos meia hora antes, sempre no mesmo horário, que pode ter um ponto de fácil reconhecimento pela criança (o apito do guarda, o fim do Jornal Nacional, etc.). Sem repetição, sem ritual, tudo fica mais difícil. Então vem a hora do banho ou do leite, escovar os dentes, colocar o pijama, um conto de fadas lido pelo pai, um beijo de boa noite e… dormir. Se a criança não consegue, então o ritual deve começar mais tarde e dia após dia o horário será “puxado” para mais cedo. Com a luz quase apagada, o adulto ficará ao lado do berço ou da cama, sem olhar para a criança e dará a segurança necessária neste início difícil. Se há desespero (choro forte) por que não um colo? Se saiu do desespero, é hora de cama novamente, tantas vezes quanto necessário. A criança deve pegar no sono na cama, sem chupeta, sem colo, sem música, sem TV. Em relação aos bebês, observe quando ele está prestes a dormir e coloque-o no berço.
Sabemos que, para as mães, tudo isto é muito difícil, pois ver o filho dormindo no colo é uma das melhores sensações desta vida. Mamãe, agüente firme! Permita que seu filho durma a noite inteira, senão o processo ficará cada vez mais difícil e talvez os pais comecem a achar que tenham “entrado numa fria”.